01/01/2008

Sr. Sato


Quando o conheci eu já era um adulto e ele era um velho. Eu havia aprendido a nadar quando era adolescente e tinha até competido pelo meu clube em alguns campeonatos.
O Sr. Sato tinha vindo do Japão muitos anos antes para trabalhar na lavoura no sul do país. Não sei exatamente como entrou em contato com a natação, mas sei que treinou a equipe brasileira por muitos anos, e enquanto foi o técnico, a equipe brasileira foi uma vencedora.
Tinha uma visão pessoal e diferente sobre como as pessoas deviam se relacionar com a água. Costumava dizer que a água é como a sociedade, quem quer dominar pela força, afunda.
Possuía um olhar observador e muito aguçado com que percebia as pessoas e parecia saber precisamente o que dizer para cada uma delas. Educou várias gerações. Não é incomum, mesmo hoje em dia, muitos anos depois que faleceu, encontrar pessoas de faixas etárias completamente diferentes, exercendo as mais variadas atividades na vida e que foram seus discípulos.
Alguns achavam que era um Mestre Zen, outros que era um Mestre Cristão. Como se as duas fossem coisas diferentes.
Suas aulas de natação eram dadas ao nascer do sol em um clube em uma vizinhança quieta perto de onde eu morava. Começávamos todos com exercícios a beira da piscina e em meio a uma sinfonia de passarinhos nossos corpos alongavam e aqueciam. Era quando nos brindava com suas opiniões a respeito das pessoas e das coisas que estavam acontecendo, sempre enfatizando que estava educando a geração que iria governar o Brasil no futuro. Depois entrávamos na água. Dentro d’água nos ensinava como se tornar uno com ela, como deixar a água nos levar.
Conseguia atravessar uma piscina de vinte e cinco metros com apenas três braçadas. Deitava-se na água e dizia que se você apenas relaxasse, a água te abraçaria como uma mãe. Você é feito de água, dizia enfaticamente.
Mesmo hoje em dia, quando observo as pessoas nadando, sou capaz de distinguir seus discípulos: são os que estão preguiçosamente deitados na água, deslizando suavemente pela piscina, satisfeitos e em paz.
Nos seus últimos anos de vida, sentia dificuldades para andar e tinha que usar uma bengala. Mas assim que entrava na piscina, estava em seu elemento e era possível discernir um levíssimo sorriso brincando em seus lábios.
Ele me deu o verdadeiro sentido da água e me ensinou a nadar como uma arte de viver.