01/01/2008

Nômades


Ao longo dos anos cruzei com vários nas mais diferentes circunstâncias. O João Au-Au, por exemplo, era um tipo que faz parte da minha infância e adolescência. Era um sujeito magro e alto e morava na esquina da Argentina com a Brasil. Tinha um carrinho de mão, desses que se usam em obra e tinha um séquito de cachorros que andavam com ele. Alguns presos ao carrinho, outros soltos. Era uma visão estranha vê-lo andando pelas ruas com aquele bando de cachorros ao redor. Uma outra vez, aos dezoito, na noite antes de ir para os EUA pela primeira vez, saí para dar uma volta a pé. Na Rocha Azevedo com a Lorena um mendigo puxou conversa e eu contei que ia viajar e para onde. Ele começou a falar em inglês, muito bom por sinal, e não foi só, falou em francês e em italiano também. Conselhos estranhos em várias línguas, tudo ao mesmo tempo. Um fim de tarde em um parque de Boston, patos na lagoa, veleiros preguiçosos, pessoas fazendo o jogging e esquilos se escondendo atrás das árvores, um sujeito parou na minha frente, apontou para os patos e disse solene: A América está morta. Eles não sabem ainda, mas a América está morta. E seguiu seu caminho. Vai ver está mesmo. A Saffron Gagné, uma mulher fugindo da própria vida e acenando para mim de uma esquina qualquer em Chicago. Viajamos dois meses pelas estradas entre Denver e a tal esquina, e até hoje não sei direito quem ela é. Uma tribo de nômades. Solvitur ambulando. As coisas se resolvem andando, ou como disse Rimbaud em uma carta da África: O que estou fazendo aqui?