01/01/2008

Bons Dias


Hoje, pela primeira vez, Lisboa, Lisabona, Terra de Ulysses. Diz a lenda que fundada pelo próprio na volta da Guerra de Tróia. Pode ser. O que se sabe é que é uma das cidades mais antigas do mundo, capital daquele que foi o primeiro país a se formar na Europa, Portugal.
Para mim, a viagem no tempo, a volta para casa que nunca conheci, já que todos do Brasil temos na memória um lado Português.
São as raízes impressas nos sobrenomes, registradas na arquitetura das casas, no desenho e conformação dos passeios públicos, na construção das frases e dos muros, no modo lusitano de expressão, com suas palavras peculiares, no seu particular uso dos verbos, na escolha, antiga aos meus ouvidos, de expressões e, sobretudo, no modo cordial de se dirigirem uns aos outros.
Entre o lugar onde me hospedei e o lugarzinho onde desfrutava o saboroso ‘pequeno almoço’, usava seis vezes as palavras ‘bom dia’. Pode parecer pouco nestes tempos de desmedida violência, mas creio que tudo começa aí: no respeito mínimo, formal e cotidiano que uns demonstram pelos outros.
Existe, percebo, na decantada alma triste dos portugueses, muito do que se ouve no Brasil em frases hoje embaladas pela ginga tropical e a herança africana. O fato é que em algum lugar da alma somos ainda portugueses, que para o Brasil viemos atrás, não da ética do trabalho, mas sim da ética da ousadia, em que não havia correspondência necessária entre o belo e o bem, em que a arte (da vida, por assim dizer) não pode ser vista como politicamente correta, pois é, no mais das vezes, na verdade, politicamente incorreta, expressão que é do que se vai à alma das pessoas e não no que lhes ditaria a consciência e o mandato do assim chamado comportamento civilizado.
Passei pelas ruas detrás, entrei em alguns antiquários e em outras tantas livrarias – comprei uma edição da Divina Comédia -, consertei meus óculos de leitura, tomei um par de expressos, tirei um par de fotos e dei os tramites por findos.
O dia seguinte começou cedo, acordei – tenho dormido no sofá com a TV ligada – e vi, através das frestas das amplas venezianas, os primeiros raios de sol. Fiquei animado com a perspectiva de ver o dia nascer na Costa do Sol. Levantei-me, preparei um café, escovei os dentes e penteei o cabelo, acendi meu primeiro cigarro do dia – sempre o mais gostoso –, e acionei o botão que levanta eletricamente as venezianas. O magnífico nascer do sol que tinha vislumbrado pelas frestas era apenas uma lâmpada do jardim.

Cada Ulysses com suas ilusões.